sábado, 1 de março de 2008

Cineclube de Aveiro/ Cinema Oita


de 28 Fev a 3 de Março, sempre às 22h

Zidane, Um Retrato do Século XXI
Um filme de Douglas Brown e Philippe Parreno

O texto seguinte foi publicado no jornal Diário de Notícias a 1 de Novembro de 2007, com o título `Michael Filmar o futebol como um bailado abstracto`.

O filme da dupla Gordon Douglas/Philippe Parreno sobre Zinedine Zidane tem um curioso subtítulo: «Um Retrato do Século XXI». E vale a pena perguntar: ao filmarem um dos mais lendários jogadores de futebol de todos os tempos, que tipo de retrato estão a propor? Trata-se de lembrar que esta é uma visão de um ícone que sobreviveu à passagem do século XX para o século XXI? Ou pretende-se sugerir que, ao retratar Zidane, os cineastas estão também a oferecer-nos um peculiar cartão-de-visita para as maravilhas anunciadas do século XXI?

Podemos responder afirmativamente: «Zidane - Um Retrato do Século XXI» é um filme que não teria sido possível no século XX. Porquê? Pelas próprias condições de rodagem. Douglas/Parreno filmaram Zidane com nada mais nada menos do que 17 câmaras, algumas delas protótipos das mais modernas e sofisticadas câmaras de vídeo de alta definição, outras, de características mais clássicas, utilizando a mais sensível película de 35 mm actualmente disponível.

Porquê este aparato? Pela originalidade do dispositivo de filmagem. Não estamos perante um "documentário" sobre Zidane, muito menos sobre uma "reportagem" dedicada às rotinas do seu dia-a-dia. As 17 câmaras registaram, em continuidade e sincronismo, um único jogo (Real Madrid-Villarreal, disputado a 23 de Abril de 2005, em Madrid, no Estádio Santiago Bernabéu). Mais do que isso: ao contrário de uma normal transmissão televisiva, as câmaras não se concentraram nas mil e uma peripécias do jogo, mas sim, obsessivamente, nos movimentos de... Zidane. Que se passa, então? Algo que já não tem muito a ver com a nossa percepção corrente de um jogo de futebol, mas que se aproxima dos conceitos de happening e performance, tal como são aplicados no domínio das artes plásticas: um verdadeiro bailado abstracto.

A formação e a carreira de Douglas Gordon e Philippe Parreno, precisamente no domínio das artes plásticas, poderão ajudar a compreender as suas opções criativas e a dimensão experimental que as justifica. Em todo o caso, creio que seria precipitado olhar para este «Retrato» como uma espécie de "anticinema"... Bem pelo contrário: estamos perante um objecto tanto mais fascinante quanto nos permite perceber que, para além das regras narrativas clássicas (muito respeitáveis, entenda-se), há todo um campo aberto de experimentação e evolução que passa pela integração inventiva de novas tecnologias e até pela calculada "perversão" dos modelos correntes da televisão.

Cineclube de Aveiro

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